António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Querido Porto

Maio 10th, 2017

Querido Porto,

Já chega. Foram 4 anos de sofrimento e dor. Sei que vais dizer que, no passado, foram muitos mais. É verdade, mas esse passado é longínquo. Um passado no qual o Campeão era sempre um de dois e os outros clubes estavam lá para enfeitar.

Houve uma madrugada que mudou o País e mudou isso também. E nós mostramos que havia Portugal para lá de Lisboa.

Mas a coisa tem corrido mal e os adeptos já não aguentam mais.

Dói muito.

Os outros ainda não ganharam o campeonato deste ano e já andam de peito feito. Vamos ter que aguentar com eles, mais um ano. E, acredita, é a parte pior de perder.

E a culpa é tua! Só tua! O apoio dos adeptos, esta época, foi incondicional e extraordinário. E tu teimas na auto-destruição.

Mas nós continuamos a acreditar em ti e, por isso, fazemos uns pedidos para a próxima época:

1 – A começar por aí: a próxima época. Prepara-a! As últimas quatro épocas ou, não foram preparadas, ou foram preparadas em cima do joelho. Não se sente um rumo, um fio condutor, a não ser obter lucro da venda de camisolas. (e, por falar em camisolas, aquele castanho… nunca mais, pá!);

2 – Dá jeito ter um treinador. Alguém respeitado pelos jogadores, admirado pelos adeptos e temido pelos adversários. Já tivemos tantos assim. É difícil encontrar outro?

3 – Queremos jogadores “à Porto”. Já sei que isso é um lugar comum, mas tu, meu Porto, pareces esquecido. Um jogador “à Porto” não é aquele que enche as redes sociais de bonitas hashtags. Não é aquele que vende muitas camisolas. Não. É um que dá o que tem e o que não tem em campo. É um que não festeja um 3º lugar, nem sorri depois de ter perdido o campeonato em casa do maior rival, nem troca camisolas como se nada fosse. É um que chora e sofre como nós! Temos muitos assim nas equipas de Andebol, Basket e Hóquei. E até acho que devemos ter alguns assim no plantel actual. Tu sempre os soubeste encontrar…

4 – Tens que voltar a perceber que isto é muito mais que Futebol. São 1.000 anos de História da nossa Cidade. É a permanente luta contra o centralismo reinante neste país, luta essa, da qual temos sido o principal expoente. Lembra-te que somos respeitados em todo o Mundo… excepto em Portugal e isso tem sido uma das nossas principais forças.

5 – Por fim, mesmo que não consigamos voltar a ganhar, pelo menos que fique a sensação que demos luta, que fizemos tudo o que estava ao nosso alcance, que fizemos o possível e o impossível.

Honestamente, a choradeira pelas arbitragens não nos fica bem. Isso sempre foi característica dos nossos rivais, que nunca nos souberam dar valor.

Este ano tivemos 10 empates! 20 pontos perdidos. Pensa onde estaríamos neste momento com esses 20 pontos, ou apenas com metade deles.

Este campeonato não foi ganho pelo Benfica… foi perdido pelo Porto, entregue de mão beijada! Chego a pensar que perdemos de propósito. E é isso que nos faz desesperar. Uma coisa é perder porque o adversário é superior. Outra coisa é perder por negligência.

Sinto que perdemos e ninguém se preocupa… a não ser os adeptos. Não há raiva, não há nervo, não há frustração… Onde andas, Porto?

Sei que muitos portistas vão ler isto e acusar-me de não ser um verdadeiro adepto, de não apoiar o Clube, bla, bla, bla…

Tretas.

Parece que agora o apoio vem por obrigação, que ninguém pode gritar “o Rei vai nu!”. Estamos mais preocupados em criticar uns aos outros, do que em ver o que, realmente, está mal…

Bolas… sou filho e pai de sócios do Porto. Cresci no Estádio das Antas e não me canso de defender o Porto. Mas chegamos a um ponto em que temos que pôr o dedo na ferida, se não continuamos na mesma… na mesma…

Querido, Porto:

Continuo, continuamos, a amar-te e a acreditar em ti. Mas precisamos de sentir-te connosco.

Para o ano há mais. Esperamos ver-te rejuvenescido, determinado e guerreiro.

É assim que te conhecemos. É assim que gostamos de ti.

Maratona de Sevilha 2017

Fevereiro 25th, 2017

Impedido de participar na Maratona do Porto 2016, procurei rapidamente uma solução no estrangeiro para poder fazer a mítica distância.

Sevilha surgiu como opção quase natural: fica aqui ao lado e de lá sempre recebi relatos muito positivos sobre a prova.

E lá parti eu para Espanha com o objectivo único de chegar ao fim, porque isto de apontar a tempos tem-se revelado problemático nas últimas corridas. Por isso, há que desfrutar da prova, da cidade e do prazer único de cruzar a meta.

O slogan impresso nos cartazes espalhados por toda a cidade dizia: “Voa na maratona mais plana do Mundo!”. Não sei se é “a mais plana”, mas é muito plana. Tão plana que me fez correr abaixo do que eu tinha planeado. Comecei a acompanhar o balão das 4h15m (tolo!) e, quando o perdi de vista pensei “daqui a pouco passa-te o balão das 4h30”. Esse “daqui a pouco” foi só aos 38km, o que me fez falar e rir sozinho no centro histórico de Sevilha, apinhado de gente. Gente a correr e que assistia. Muita gente que assistia.

Se o percurso de Sevilha pouco tem de entusiasmante, exceptuando a última meia-dúzia de quilómetros que atravessa a zona histórica, guiando-nos ao Estádio Olímpico (e quando temos o Porto como referência, numa linha contínua de rio e mar, é difícil encontrar algo mais entusiasmante), o mesmo não se pode dizer das milhares de pessoas que, do primeiro ao último quilómetro, do primeiro ao último atleta, incentivam os corredores de forma permanente.

E, para mim, foi essa a grande surpresa da Maratona de Sevilha: o público! “Vamos! Vamos! Vamos! Animo! Animo! Animo! Soys uns campeones! Ya no queda nada!” São incentivos que ouvimos ao longo de todo, mas mesmo todo, o trajecto. Não há quilómetros mortos ou desertos. Há sempre alguém que te olha nos olhos, sorri para ti e te incentiva a dar mais um passo. E, para quem corre, isso é fantástico!

E este é um ambiente vivido também nas zonas de abastecimento. Os voluntários não se limitam a segurar os copos de água e isotónico com cara de frete. Sorriem, incentivam, apoiam e estão cheios de bom-humor: “Este Aquarius sabe a cerveja! Mojitos! Mojitos fresquinhos! Tirem-mo da mão, senhores! Tirem-mo da mão! Aquarius fresquito! Tirem-me da mão!”

Com um ambiente destes, o que pode correr mal?

Em 42km195m, há muita coisa que pode correr mal. Desta vez, a mim tudo correu bem.

Ao ver os cartazes “Força Papá!” pensei sempre nos meus filhos; a cada bandeira portuguesa que encontrei pelo caminho (e foram muitas!), gritei sempre “Portugal!”; ao ver a Teresa à entrada do Estádio fui a correr em direcção a ela e parei 2 segundos para um beijo tão especial que me faria correr mais 42km; fiquei triste por ver o Echtelion da Fonte em sofrimento aos 20 e poucos quilómetros, mas, como ele é um fixe, esqueceu a sua dor naquele momento e mandou-me para a frente “Vai que tu estás bem! Há cerveja no fim!”

Somos uns doidos, ao fazer tantos quilómetros, longe de casa, “só” por estes “pequenos” prazeres da vida: um sorriso, um beijo, uma cerveja…

Ganhas alguma coisa com a Música? Sim: asas!

Janeiro 29th, 2017

É uma pergunta que ouço com frequência. Toda a gente quer saber quanto pode ganhar um Músico, mas aquilo que recebemos a tocar não pode, jamais, ser quantificado em euros, dólares ou qualquer outra unidade monetária.

Outra pergunta que me fazem é: “mas, vais tocar de borla? o que ganhas com isso?”

Asas.

Prova disso, foram os momentos vividos este fim de semana.

Na sexta-feira, mais um concerto da Invicta Big Band. É cada vez mais difícil descrever as sensações que cada actuação da IBB proporciona. Uma orquestra que completou, semana passada, 5 anos desde a sua apresentação oficial e que nasceu da forte vontade de um grupo de pessoas extraordinárias, que me conseguiram convencer de que poderia ser o seu líder. Contudo, se há algo que me orgulha na IBB, para além da sua solidez enquanto instituição e de nunca ter dado um passo maior que a perna, é a forma como todos os envolvidos contribuem para a sua construção. E o que aconteceu na preparação da actuação de sexta-feira, materializa isso mesmo. Acho que pela primeira vez em 5 anos, pouco mais tive que fazer do que… dirigir. E, quando o peso de tudo o resto sai dos nossos ombros, torna-se mais fácil sentir a Música e fazer com que 20 artistas diferentes toquem a uma só Alma. Conseguimos.

A IBB dá-me também o privilégio de trabalhar com músicos de grande qualidade, alguns deles já profissionais e com os quais aprendo a cada compasso que passa. E eu gosto tanto de aprender…

Depois, no sábado, o Harmonic 4 Concept – Best Philarmonic Rock Ever. Depois do sucesso do Symphonic Clapton, em 2016, a fasquia estava muito alta. Mas em Santa Maria da Feira, não se brinca em serviço. Há um grande timoneiro, Gil Ferreira, um Vereador da Cultura como deve ser um Vereador da Cultura. Por vezes, parece mágico, dada a sua capacidade de estar, basicamente, em todo o lado. Mexe-se e faz mexer. E Santa Maria da Feira transformou o tradicional, gasto e enfadonho modelo de “encontro de bandas: desfile – concerto – concerto – concerto – concerto – marchinha em conjunto”, num espectáculo original, único, criativo, extraordinário, que de facto envolve e compromete as pessoas e que não abdica de elevados padrões de qualidade. E que qualidade têm os arranjos do Luís Cardoso! Assentam como uma luva nos temas originais e entusiasmam quem toca e quem ouve.

Este ano, o concerto de encerramento da Festa das Fogaceiras, deu-nos o prazer de partilhar o palco com músicos de projecção nacional. E isso não tem preço. E depois, em vez de colocar as filarmónicas em posição antagónica, quase em despique, junta-as no mesmo palco, a trabalhar para o mesmo fim, não só no concerto, como nos ensaios durante as semanas antecedentes. E aprendemos uns com os outros.

Assim se faz Música. Assim se faz Arte.

O Professor António Saiote costuma dizer que “é a Arte que nos eleva.”

E tão alto voamos por estes dias… Saibamos, pois, continuar a desfrutar do vento sob as nossas asas.

“Please keep fighting, keep fighting, together we can build something beautiful.”

O meu presente de Natal

Dezembro 22nd, 2016

A nossa sociedade está cada vez mais agressiva. Vê-se nas caixas de comentários da Internet e redes sociais; vê-se no trânsito, nos centros comerciais, nos debates desportivos; vê-se nas notícias.

As pessoas explodem por dois motivos, por tudo e por nada. Não temos capacidade (nem queremos) para argumentar os nossos pontos de vista forma cortês e com urbanidade. Aliás, perante a falta de argumentos, partimos de imediato para o insulto. Não se podendo atacar a ideia, ataca-se a pessoa, para descredibilizar a ideia.

E tem muito a ver com algo que já abordei anteriormente neste artigo: https://www.antonio-pinheiro.net/analfabetos-que-sabem-ler-e-escrever/

E tudo porque encaramos uma opinião diferente da nossa como uma agressão, um insulto, algo pessoal. Somos incapazes de aceitar e lidar com a diferença. Metemos a faca nos dentes e partimos ao ataque.

Eu próprio me penitencio.

Por isso, o presente que gostaria de receber neste Natal seria uma consciencialização colectiva de Tolerância e Respeito pelo Outro, enquanto ser Diferente e Único. Tanta coisa seria melhor se percebêssemos que os Outros são diferentes e não podem ser iguais a nós; se percebêssemos que é esta Diferença que enriquece o Ser Humano. Viveríamos mais felizes, tranquilos e em verdadeira Paz.

É este o meu desejo para este Natal e o meu maior propósito para o Novo Ano.

Feliz Natal, Amigos!

24H Portugal: A Prova.

Setembro 18th, 2016

Quando uma edição das “24H Portugal” chega ao fim, costuma sobrar-me apenas uma palavra: nostalgia.

Porque esta prova é muito mais que mais um evento desportivo, mais uma corrida, numa época em que as corridas, por tudo e por nada, proliferam como cogumelos.

As “24H Portugal” são uma enorme celebração que, no fim, nos deixam no coração aquela sensação que temos ao ver o fogo de artifício que encerra uma romaria de Verão: foi muito bom e para o ano há mais.

As “24H Portugal” têm o imenso mérito de juntar e concentrar no mesmo espaço corredores de estrada, “trailers”, famílias, amigos, num ambiente de convívio, alegria permanente, que começa com a montagem das tendas e termina com abraços, sorrisos, lágrimas e um “até já”, que tanto pode ser um “até à próxima prova” como um “até p’ró ano”.

Hoje, quando dei por concluída a minha prova, enquanto me punha a medalha de participação ao pescoço, o Vitor Dias perguntou-me: “Gostaste da festa?” Reparem, que ele perguntou se gostei da festa, não da prova ou corrida.

E este fenómeno torna-se ainda mais extraordinário pela prova coincidir com o fim de semana da Meia-Maratona do Porto.

Estava lá “toda” a gente. Estavam os meus colegas de equipa do ano passado: a Paula Lage e o Zé Ferreira que não foram correr, mas foram incansáveis a apoiar o pessoal; e o António Morais, que o ano passado disse que as 24H eram uma experiência a não repetir, mas que este ano não largou a sua amada Carmen por um minuto. A Carmen que surpreendeu tudo e todos com uma prova extraordinária, chegando a liderar a classificação feminina. Classificação feminina que foi vencida pela Flor e levou a fenomenal Analice Silva (72 anos) ao 3º lugar do pódio. Entre elas ficou a polaca Agata “qualquer coisa”, que com aquele ar eslavo de quem não parte um prato, fartou-se de “tricotar”.

Estava o Echtelion da Fonte que me dava um grande empurrão psicológico sempre que passava por mim. Correu 50km e depois ficou por ali a ver o pessoal. Correu muito tempo com o Paulo Gomes. O Paulo Gomes deu 3 voltas comigo, já a noite estava fria. Entretanto parei para abastecer e o Paulo foi à vida dele.

E por falar em Paulo, estava o Rodrigues, o Massagista. “Na primeira volta parece que vou a puxar um camião… anda Pinheiro!”

Esteve lá o Mário Meneses e o Marcos Soares.

Esteve a Retorta. Já se sabe que a sua capacidade de trabalho só tem paralelo no seu sentido de humor e boa disposição. Por isso, aguentaram estoicamente os queixumes dos atletas mais caprichosos “as bananas estão verdes, a água está quente, onde está o meu copo?” E iam metendo conversa. Assim até custa menos.

E mesmo quando já tens bolhas nos pés, que ardem como o inferno, o Morais surge de trás de uma tenda e diz “acordaste forte!” e tu até aceleras… tolo!

O Vitor Dias, como na primeira edição, fez questão de me por a medalha ao pescoço. Um gesto com muito significado para mim… muito mesmo. E esteve a sua família. A Ana fez um ar incrédulo quando eu lhe disse que, apesar das bolhas, ia fazer mais uma volta. O Gonçalo preocupado com a minha sanidade mental por, de vez em quando, passar o CD dos D.A.M.A. e o Franciso a achar que eu ia desfalecer ao ouvir a versão samba do “Otherside” dos Red Hot.

E o Meixedo, que leva sempre o seu sentido de humor, tranquilidade e pragmatismo, fazendo com que tudo pareça simples.

À distância estiveram amigos que iam mandando mensagens e comentando as publicações no Facebook. Esteve, claro, a D. Prazeres Pires. Aquele telefonema à hora do jantar fez-me imensamente bem.

E esteve o meu staff de apoio! Sim… eu tive staff!

A minha adorável e incansável esposa, Teresa Sala, teve a capacidade de reunir e liderar uma equipa que me preparou uma tenda, tratou dos meus equipamentos (sim, Marta Bento, quem corre cheira mal) e, acima de tudo, fez-me sentir bem e ignorar as dores e mazelas que iam surgindo. Susana Guerreiro, para o ano também corres.

Oh… haveria muito mais a dizer destas 24H, mas as palavras quedam-se por aqui. Sinto que me esqueci de alguém, mas para o ano lá estaremos. Foi uma festa bonita, sim senhor.

Jogos Olímpicos: o que Portugal precisa de aprender sobre Desporto

Agosto 21st, 2016

1988.

Pela primeira vez na minha curta vida (tinha 8 anos) assistia a uns Jogos Olímpicos.

Assistia religiosamente. Todas as manhãs, em frente à TV (ainda a preto e branco) esperava que aparecesse uma bandeira portuguesa. Não, não estou a falar nas cerimónias de entrega de medalhas. Para mim, seria mais que suficiente ver portugueses competir… competir! Eu queria lá saber se ganhavam ou não… Queria era ver Portugal no meio de tantos países. Mas nada..

Para quem não se lembra, naquela altura, íamos aos JO com “meia-dúzia” de atletas. Em 1988 tivemos apenas o José Garcia na canoagem. Tínhamos o Alexandre Yokochi na natação e alguns corredores de fundo e meio-fundo no atletismo, dos quais se destacou a Rosa Mota ao ganhar a medalha de ouro na Maratona (numa altura em que os países africanos, nomeadamente o Quénia, ainda não tinham “aprendido” a correr).

Lembro-me de termos ficado tristes pelos gémeos Castro e pelo José Regalo terem falhado as medalhas por um “bocadinho assim”. O mesmo “bocadinho assim” que, em 2016, travou a canoa do Fernando Pimenta, ou representou os 10 segundos entre os nossos atletas de triatlo e o pódio.

E milésimos. Milésimos de segundo que ficaram entre o K2 português e a medalha de bronze.

Mas voltemos a 1988. Horas e horas em frente à TV e a bandeirinha portuguesa teimava a não aparecer nas starting lists.

1992.

Barcelona aqui ao lado. Desta vez, a comitiva pareceu maior (também eu já era mais crescido). Mas medalhas: zero! Zero!

E agora?

2016.

Finalmente a bandeirinha portuguesa estava por todo o lado, em modalidades que em Portugal ainda são “amadoras”. De tal forma que a bandeirinha chegou a várias finais e a milésimos dos pódios. A bandeirinha portuguesa foi a melhor da Europa em disciplinas técnicas do atletismo, algo impensável nos anos 90, ou nos anos 80 que tantos saudosistas gostam de recordar.

A bandeirinha andou por lá, no ténis de mesa, na vela e até no hipismo! Na canoagem de slalom a disputar a final! Carago, isto não vos enche as medidas? Pela primeira vez tivemos um atleta nesta modalidade (tão difícil de treinar em Portugal) e ele apura-se logo para a final!

Estamos todos loucos com a conquista do Europeu pelo Futebol. Uau… sabem quantos títulos europeus já nos deram o atletismo, a canoagem, o judo e até o Ténis de Mesa?

E agora pensem: quantos anos foi preciso para, finalmente, termos um título europeu no futebol?

Sabem quantas medalhas internacionais tem o tão criticado Fernando Pimenta? 67. 67!

Aos críticos dos atletas olímpicos portugueses deixo uma pergunta:

  • Vocês são um dos 3 melhores do mundo na vossa profissão?

Não? Então, pelo vosso próprio critério aplicado aos desportistas, tenho uma coisa a dizer: vocês são uma vergonha e uma desilusão. Andam apenas a passear nos vossos empregos.

Durante 4 anos, ninguém quer saber dos atletas olímpicos. Mas, de 4 em 4 anos, estão todos de dedo em riste a criticar.

Em Portugal, não gostamos de Desporto. Gostamos de Futebol.

Quando somos crianças, ensinam-nos que “perder ou ganhar” é Desporto. Pois… mas quando perdemos: “vergonha”, “fiasco”, “desilusão…”

Pela lógica de muitos comentadores e comentaristas, em cada modalidade olímpica só deveriam concorrer 3 países, um para cada medalha, porque não faz sentido ficar em 4º, em 5º, ou em 100º. “Se não for para ganhar, fiquem em casa.”, li eu, hoje, algures no Facebook.

Em 2020, estarei novamente à procura da bandeirinha portuguesa.

 

Analfabetos que sabem ler e escrever

Julho 8th, 2016
Em Portugal há muitos analfabetos que sabem ler e escrever.
 
A prova disso é a quantidade absurda de pessoas que ainda não percebeu que a página Dr. Jovem Conservador de Direita é uma página de humor, pautada pela ironia e pelo sarcasmo, levando a sério tudo o que lá é escrito pela personagem (sim, personagem!) Dr. Jovem Conservador de Direita.
 
E isto acontece em muitas outras situações. As pessoas lêem mas não compreendem.
 
Isto é o reflexo do imediatismo da sociedade em que vivemos, em que simplesmente deixamos de pensar. Vemos, absorvemos, consumimos, expelimos.
 
Não se estimula a reflexão, o espírito crítico o debate, a discussão, a argumentação. Tudo tem que ser unânime, consensual, directo.
 
Até no futebol, se ousamos criticar (mesmo que fundamentadamente) o nosso clube ou a selecção nacional, levamos logo com um monte de indignados em cima.
 
Quantas vezes, nas nossas vidas, ao expressarmos uma opinião divergente do nosso interlocutor, obtemos de imediato uma reacção violenta e disparatada, quando o ideal seria a contra-argumentação?
 
As pessoas encaram o confronto de ideias como um confronto pessoal. “Se não concordas comigo, é porque não gostas de mim.”
Não. É possível discordarmos e sermos amigos, namorados, casados, família. É possível e é normal. Deveria ser normal.
E por isso as redes sociais estão cheias de disparate.
E isto acontece também porque não se valoriza a leitura, o conhecimento, o saber. “Lá estás tu armado em sabichão.” “Ópera? Mais vale ouvir kizomba!”
Mesmo na Internet, partilhamos as notícias mais infundadas sem sequer termos a certeza da sua proveniência. Quantas vezes morreu o Camilo de Oliveira, antes de efectivamente ter morrido?
E assim vamos definhando, cada vez mais analfabetos, mesmo sabendo ler e escrever, porque não entendemos aquilo que lemos, nem sabemos aquilo que escrevemos.

UTSF 2016: Um “Finisher” que não devia ter sido

Junho 27th, 2016

Haveria muitas maneiras de começar esta história. Dei muitas voltas à cabeça. Mas, há pouco, deparei-me com um comentário do Pedro Machado que me tirou as dúvidas e, aqui vai:

  • o meu prémio de “Finisher” do Ultra Trail Serra da Freita 2016 vai inteirinho para a minha esposa: Teresa Sala.

Para perceberem o que é a “Freita”, recomendo a leitura do texto do Rui Pinho Os Filhos da Freita. Vão lá espreitar e, só depois, venham ler isto.

Quando, em 2015, conclui esta prova, senti-me capaz de fazer qualquer coisa. Tinha superado aquela que é a prova Rainha e Mãe do Trail Nacional. Uma prova “extreme, para atletas de elite”, como define o seu grande mentor, José Moutinho.

Era certo que voltaria, porque a Freita é hipnótica e é impossível ficarmos longe. Tudo chama por nós, mesmo o sofrimento.

Talvez pela experiência do ano passado e pela “memória” que o meu corpo tinha daqueles trilhos, ultrapassei os primeiros 33km sem grandes dificuldades. O meu ego inchava. Recebi um abraço do Moutinho ainda antes dos 9km e palavras de incentivo do João Oliveira (sim! desse João Oliveira…) que me chamou “campeão” (lol!). Entrei na “Besta” à confiança, ultrapassando-a em menos de 1h (ou estou a ver mal o gráfico?), sem parar, sem as dores e as câimbras do ano passado. Cheguei ao topo e ainda tive tempo e boa disposição para pegar com o Luis Pereira, grande arquitecto dos Trilhos do Paleozóico.

As coisas corriam de feição e deslarguei-me pela descida que se seguiu, saltando alegremente de pedra em pedra.

No abastecimento de Manhouce lá estava a Carmen a cortar tomates. Passou a manhã a cortar tomates. Devia ter ficado aqui mais um pouco. Devia ter comido um pouco melhor. Mas eu queria correr dali para fora, porque a seguir viria a zona de SPA.

Viria. No trajecto de 2015, foi nesta zona que eu e o Ricardo Monteiro nos deliciamos com os riachos da Freita. Mas, para 2016, o Moutinho tinha reservado uma subida… uma longa subida, quase 3km, onde por pouco levei com a “marreta” (essa, viria mais tarde).

Na descida recuperei o fôlego e o ânimo. O Jerome (vencedor da prova de 100km… que animal!) passa por mim a voar, enquanto eu pensava em que calhau punha os pés.

Finalmente o SPA! Acreditei, na minha inocência, que as frescas águas seriam o bálsamo suficiente para chegar à Lomba, que era já mesmo ali, e desfrutar do abastecimento quente: canja, bifanas e as famosas minis.

Não. Haveria mais que descer. E tudo o que desce tem que subir. Vimos a Lomba passar ao lado e aquela interminável descida não augurava nada de bom.

Tudo o que desce tem que subir. Eram as Escadas do Martírio, que eu baptizei como a Besta 2.

Tive que parar várias vezes, derrotado, desanimado. “Vou desistir na Lomba.”

Estava farto daquilo. Não queria mais. Era “moutinhada” a mais para mim. O Carlos Sá diz que anda à procura dos limites dele. Eu encontrei os meus ali, naquela escadaria maldita.

Ia desistir na Freita. Não é vergonha nenhuma. Como também já li hoje, na Freita “não há desistentes, há aqueles que chegam mais longe.”

No abastecimento, enquanto comia e pensava na melhor forma de dizer à Teresa “vou desistir”, toda a gente tentava animar-me: voluntários, vassouras, malta que andava por ali… “Desistir? Agora? Está quase!”

Quase??? Faltavam 22km! Quase…

Peguei no telefone e liguei para a Teresa.

“Vou desistir, não aguento mais.”
Resposta: “Mas porque não tentas?”

E nisto o coro de apoiantes repete: “Não desistes nada!”

E eu feito burro, não desisti.

A partir dali, foi um martírio. Foram poucos os momentos em que consegui correr e, nos 5km finais, já nem caminhava. Acho que os zombies do Walking Dead têm mais destreza de movimentos que eu tive naquela altura.

Chegada a Arouca. Havia gente. Ouvi aplausos. A Teresa e a Mãe estavam lá a sorrir. Bolas… Ouço uma voz que diz “esta já ninguém te tira”. Começo a chorar e penso “esta é aquela que eu não queria ter”. Entrei no Pavilhão a correr, porque… sei lá. Mas senti-me derrotado no pórtico da meta. Assim não.

Valeu naquela altura e extrema simpatia dos voluntários que estavam na meta e a forma efusiva como me deram a medalha, o prémio de “finisher” e me tiraram fotografias. Valeram as palavras do Paulo Rodrigues (muito e muito obrigado!).

Mas valeu sobretudo pela presença única da pessoa que merece a medalha, merece o prémio e todas as honras. Depois da prova, já em casa, ainda teve a paciência para me tratar das várias feridas espalhadas pelo corpo, mas sobretudo na alma.

Que grande mulher eu tenho do meu lado…

“Isto era escusado…”

Voltarei à Freita? Sem dúvida, nem que seja para fazer o trail curto, a caminhada, ou como voluntário para estar num abastecimento a dar força ao pessoal. Talvez tente outra vez os 65… não há duas sem três…

É hipnótico. Não conseguimos abandoná-la.

Obrigado a todos os que de uma forma ou outra me apoiaram nesta aventura. Para além dos já mencionados, acrescento: Prazeres Pires, Sérgio Duarte, Barras Olimpo, Duas Faces Comunicação, José Ferreira, Mário Meneses, Rui Pinho, António Morais, Liliana Gomes, Raquel Campos, Pedro Machado, Sofia Ferreira e a todos os atletas que, ao longo dos 65km foram partilhando alguns kilometros comigo.

Até à próxima!

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.