Antes de ser o treinador da moda e do regime, ou da moda do regime, JJ era famoso pelos seus tiros no porta-aviões, mesmo que expressos de forma gramaticalmente questionável.
Ao serviço do Braga, depois de ter sido roubado escandalosamente contra o agora seu clube, afirmou: ganhar na Luz, só na PlayStation.
Ao serviço do Belenenses, antes de um jogo contra o agora seu clube, afirmou: o fair play é uma treta.
O povo e a opinião pública tendem a definir o fair play como um conjunto de gestos, ritos e cerimoniais que, na verdade, em nada têm a ver com fair play.
Fair play, no fundo, é competir de forma justa. Nada tem a ver com palminhas, corredores de honra ou mandar a bola fora quando um adversário está lesionado.
Fair play é entrar no jogo para ganhar, dar o máximo para o conseguir e fazê-lo de forma justa.
Tudo o resto é folclore.
Pavilhão de Crestuma. Futebolada de sábado de manhã.
Ela estava à minha frente, redondinha, pronta. Olhei para ela, olhei para a baliza. Mesmo sendo uma nódoa em geometria, cometendo a proeza de, até com a régua, desenhar linhas tortas, percebi que, com determinada força, determinada direcção… era golo.
Na melhor gíria futebolística, puxei a culatra atrás.
Não é que tenha muita força, mas ali, foi alguma.
Só que… uma adversária (sim, tínhamos raparigas a jogar… e muito bem!), viu o mesmo que eu. Viu a redondinha, a linha recta para a baliza e a força que eu preparava para aplicar na bola. Corte providencial, mas o meu pé já não foi a tempo de parar e encontrou, no local onde milésimos de segundo antes estava a bola, o pé da rapariga. Estrondo.
“Oh António! Tu és tolo! Viste o que fizeste?”
Mas eu só queria chutar a bola…
Pedi desculpa enquanto ela se contorcia de dores no chão. Fui rodeado “eh pah… estamos aqui para nos divertirmos… não era preciso isso…”
Mas eu só queria chutar a bola.
Estádio de Braga. Janeiro de 2019. Final da Taça da Cerveja, ou lá o que é…
Oliver Torres está de olhos fixos na bola. E só na bola. Como eu, ele só quer chutar a bola, não para marcar golo, mas para a tirar dali para fora. O jogo aproxima-se do fim e, só agora, é que o adversário decidiu que quer ganhar de forma justa, depois de oitenta minutos de jogo passivo, a fazer de tudo para levar a decisão para os penaltys.
Durante oitenta minutos, só uma equipa teve fair play. Dentro do campo, na relva. Só uma equipa, a do Oliver, lutou para vencer. A outra escondeu-se na manha, na “chico-espertice tuga”.
Oliver Torres está de olhos fixos na bola. Ele só quer chutar, mas um adversário, como a minha adversária, naquele momento, atravessa-se. Penalty.
A equipa do Oliver, pobre Oliver, acaba por perder no desempate.
A frustração é visível, audível, sensível…
Não há espaço para mais nada no coração de quem deu tudo e perdeu de forma tão inglória.
As redes sociais, a opinião pública, o povo, vocifera contra a equipa do Oliver, por falta de fair play?
JJ tinha razão. O fair play, como nos querem vender, é mesmo o treta.
E o Oliver e eu, só queríamos mesmo chutar a bola.