António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Ecos da Saudade

Fevereiro 28th, 2009

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Eram separados pelo Mundo, pela Vida, por algo tão forte e incompreensível, que os obrigava a amarem-se sem se verem, sem se ouvirem, sem se cheirarem, sem se tocarem, sem se saborearem, unidos apenas pelo sentimento, por lembranças, pela intensa memória dos sentidos.
A distância, a ausência, aguçava-lhes ainda mais o ardor da paixão. Por não se verem, viam o amante constantemente, numa flor, numa estrela, no sol… Por não se ouvirem, escutavam-se nas músicas favoritas, partilhadas em segredo… Por não se cheirarem, cheiravam-se nos perfumes eternos, tatuados a fogo na paixão do último encontro… Por não se tocarem, tocavam-nos próprios corpos com as mãos imaginárias do outro… Por não se saborearem, sentiam ao adormecer o toque terno dos lábios do apaixonado…
Então, por vezes, o Mundo, a Vida, desapareciam e podiam ser eles os dois. Apenas os dois. Em beijos apocalípticos, destruíam o planeta em que viviam e, com a força de abraços infinitos, criavam um novo Universo. A fusão dos seus corpos, baralhando os sentidos que na saudade os uniam, era o despoletar de novas formas de vida. Viam sabores, ouviam cores, cheiravam beijos, tocavam sons e saboreavam odores. E, depois da euforia, depois de voarem pelas galáxias, desenhando sinfonias nas estrelas, caíam no cansaço. Repousavam no peito, trocando suaves beijos e preparando-se de novo para a saudade.
Regressariam ao Mundo, à Vida… E refugiavam-se nas memórias dos sentidos. Sós, distantes, perdidos mas, ao mesmo tempo, tão perto um do outro como se fossem um só.

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.