António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Partida

Janeiro 27th, 2010

Vou cavalgar sem olhar pra trás
Só o meu ser sabe que é capaz
Queimar a capa da solidão
Partir o copo da ilusão

Vencer a dor do meu sangue a arder
Correr o mundo sem me perder
Sentir a força que há em mim
Beber a vida até ao fim

A multidão não me seduz
Entrego o corpo a uma só luz
Encontro a paz só num olhar
E a noite escura há-de findar

Ontem e hoje

Janeiro 26th, 2010

Longe vai o tempo, em que as minhas roupas voavam nas tuas mãos e me tomavas por inteiro.

Longe vão os dias, em que os lábios falavam sem palavras e as línguas eram poesia.

Longe vão as horas, em que a tua pele era o meu porto e o teu olhar o meu refúgio.

Longe vão os minutos, em que “amo-te” era pouco para um amor que era mais que ele próprio.

Longe vão os segundos, em que eramos apenas um grito.

E hoje sou teu por inteiro.

E hoje falamos sem nada dizer, em poesias invisíveis.

E hoje és o meu porto e o meu refúgio.

E hoje amo-te como nunca te amei.

E hoje somos sempre aquele grito.

Whiskey Cola

Janeiro 17th, 2010

Sabia que aquela era noite, longe de suspeitar que seria a última. A primeira de muitas, pensaria.

Desejou-a todo o dia. Em encontros breves, trocavam olhares e ao mesmo tempo uma promessa. Uma promessa da noite mais quente das suas vidas.

Foi no bar, por entre amigos envoltos em conversas triviais.

Ele pediu a primeira bebida. Consumido pelo calor, absorveu o líquido, praticamente, de uma só vez. Respirou.

“Outro, por favor”.

O seu corpo cedia já ao impacto do álcool. Começava o estímulo físico, daquilo que há muito lhe habitava a mente. E ela estava tão perto.

O segundo foi saboreado com mais calma, discernindo o duplo sabor do despudorado cocktail. No fim da última gota estava já irrequieto. Os olhares eram cada vez mais intensos e parecia que os corpos já se tocavam. Fechando os olhos, sentia-lhe a boca, a língua, a pele, o odor.

Veio o terceiro e, ao pousar o copo na mesa, levantou-se decidido.

Quase que a arrancou do assento: “vamos!”

Faltava muito para chegar a casa, por isso começaram no carro, em andamento, aquilo que iriam terminar na cama, parados. Nem o excesso de alcoól, nem a excitação o faziam perder o controlo do veículo. Abrindo os olhos, sentia-he a boca, a língua, a pele, o odor.

Ela recebia-o na boca, enquanto ele a tinha nas mãos.

Pouco faltou para arrombar a própria porta de casa. Pouco faltou para as roupas serem reduzidas a trapos. Pouco faltou para que gritos estridentes despertassem a sonâmbula vizinhança. Pouco faltou para que o suor se transformasse num rio.

Até que veio o sémen, veio o repouso, veio a hora dela regressar a casa.

À dor de a ver partir, juntou-se a dor de nunca mais voltar.

Ao frio da noite, juntou-se o frio da distância.

À mágoa do pecado, juntou-se a mágoa da saudade

E depois viu aquele rosto nas estrelas.

Não, não podia ser apenas luxúria. A luxúria é apenas um cometa. Rápido, quente, flamejante.

Mas as estrelas são eternas. Brilham, mesmo que ocultas pela neblina.

Ecos da Contenda – 2

Janeiro 11th, 2010

Bolas, como é difícil…
Procurar uma luz e não a ver.
Ter uma meta e não a atingir.
Querer um sonho e não adormecer.

Como dói sentir as pernas imóveis
Os braços gelados
Querer pensar e não conseguir
Não abrir os olhos
Não abrir a boca
Palavras presas
Pensamentos vazios

Mas tu
Guerreira de tantas batalhas
Que com o rosto em sangue
Pisaste os teus inimigos
pegas na espada.
Cerras os dentes.
E lutas.

Como sempre lutaste
E sempre venceste.

E vais vencer.

Porque nada te demove.
Porque eu sei quem és.
Fazes parte de mim.
E também eu fui à liça.
E contigo fui vencedor.

O suor pesa-te.
As feridas doem.
Mas o teu olhar.
Esse olhar que um dia o céu me deu.
É mais forte que tudo.

E depois…
Com o corpo por terra
Desfeito pelo cansaço
Vais sentir o meu abraço
Vais sentir que valeu a pena
E poderás, então, dormir
Repousar
Sonhar.

Foz

Janeiro 6th, 2010

Recebi-te no meu colo.

Ferida.

Triste.

Mas com aquele sorriso com o qual construímos histórias de magos e dragões.

Conseguias, no meio da dor, com sangue a manchar-te a pele, manter o mesmo sorriso e o mesmo olhar.

E foi aí que senti a força que tu precisavas.

O vento beijou-nos a pele, enquanto expulsávamos demónios presos em palavras inúteis.

O mar serviu-nos de abrigo,  enquanto o rio nos servia a ilusão.

Foi bom ter-te de novo.

Foi bom saber que não caíste.

Curar-te as feridas.

Lançar-te para ti.

Espero por ti de novo…

Tu

Dezembro 16th, 2009

Se me perguntarem o teu nome, responderei mel, chocolate, doçura.

Se me perguntarem o teu cabelo, direi que escondeu a luz do sol e o encanto das estrelas.

Se me perguntarem os teus olhos, responderei arco-íris.

Se me perguntarem o teu corpo, direi que é um castelo secreto.

Se me perguntarem quem és, responderei “sou eu”.

Quero voltar

Dezembro 14th, 2009

Quero voltar a esse mar
Onde secretamente mergulhamos
Banhados em sonhos e desejos
Húmidos de azul

Quero voltar ao céu
Com asas de mil sabores
Lado a lado com magos alados
Entre beijos e suor

Quero voltar àquele tempo
De fugas na floresta
Doces dores docemente domadas
Em sentidos intensos

Quero voltar à loucura
A explosões de sangue ardente
Com o embalo da chuva como cama
E uma pela tão branca
Tão pura
Tão minha
Tão terna

Que para sempre
Eternamente
Na minha ficou gravada

Mas eu quero voltar
Nem que seja por um segundo
Sentir-me acolhido naquele mundo
Onde o Mundo esquecia
Encantado dormia
No mar
No céu
No tempo
Na loucura

Sob as pontes

Outubro 27th, 2009

Areia que te foge entre os dedos
Vida que passa sem a viveres
Perdido, rendes-te aos medos
Sonhas para não amanheceres

Quem pintou esse quadro?
Com cores que não existem
De um arco-íris imaginário
Onde as sombras sobrevivem

São estrelas que se apagam
Ao toque da neblina
As mãos que te afagam
O corpo que te domina

Quem fez essa canção?
Com notas que são espadas
Vazias de emoção
Como longas madrugadas

São pontes que por ti passam
Sobre um rio de sangue pintado
São beijos que te embaraçam
No mar que já foi salgado

Quem escreveu esse poema?
Com versos de fogo ardente
Cada rima é um dilema
Que te consome a mente.

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.