António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Anoitecer

Agosto 6th, 2009

É nessa hora que matamos o Mundo.

Voas comigo para outro planeta. Um planeta que os nossos sonhos desenharam num Universo que não existe.

Somos Deuses e ao sétimo dia descansamos, nos braços um do outro. Vimos tudo o que tínhamos feito. Era tudo muito bom.

No princípio era o Verbo e no fim só restam sorrisos, beijos soltos e suor.

Escuta!

Agosto 5th, 2009

São pessoas, meu cabrão!

Pessoas!

Que têm sentimentos, que pensam, têm vontade própria!

Não são objectos nas tuas mãos, nas cadeias da tua eterna e crescente prepotência!

Não são engrenagens na máquina do teu egocentrismo!

Porquê? Porque as fazes sofrer? És sádico? Dá-te prazer?

É bom vê-las chorar?

É bom vê-las de rosto cinzento e abatido?

Desaparece, pá!

Morre!

Legionário

Agosto 2nd, 2009

Nunca procurou o caminho fácil. Para ele as rectas eram a pior distância que poderia percorrer. A sua vida precisava de montanhas, abismos. Precisava ser ele a desbravar os caminhos para metas que mais ninguém compreendia.
Complicava.
Sempre complicava, mas porque desejava que a sua existência fosse uma história de conquistas.
Tudo o que era simples, não era para ele. Era preciso risco, dor, sofrimento até, mas tudo isso lhe garantia a glória na chegada.
Aí, refrescava-se nas gotas do seu suor. Olhava para as feridas e gozava com o ardor e o sangue a escorrer.
Como era agradável saber que tinha olhado a morte e vencido.
Depois de um breve descanso, com as feridas ainda mal saradas, atirava-se de novo à contenda.
E nos altos e baixos, na montanha russa que ele próprio tinha desenhado,  entregava-se a delírios insanos, que o anestesiavam. Assim, debruçava-se no abismo com um sorriso nos lábios, ria da arma apontada à testa e zombava dos mais ferozes inimigos.

A Mis el Adane

Julho 31st, 2009

E fiquei toda a noite a ver-te dançar.
Bebi mais um copo e deixei-me embalar pelo voo dos teus cabelos.
Estavas feliz, emanavas luz e parecias segura do destino de todo o Mundo.
E eu amei-te tanto ao som da nossa música.
Por momentos, fui eu quem agarrou aquele microfone e te jurei o meu amor mais que eterno, em notas soltas, presas por um ritmo cadenciado.
Fui o palco.
Tu foste as luzes.
Fui a voz.
Tu foste a guitarra.
Fiquei ao longe, a observar cada gesto, cada movimento do teu corpo, numa dança só tua e, ao mesmo tempo, só nossa.
Alguém disse “vi-te dançar e a minha paz morreu”, mas quanto mais dançavas, mais o meu coração atingia a paz que tanto procura.
Entreguei-me aos teus olhos e senti que me querias.
Por um breve instante, pareceu-me ler nos teus lábios… e tu sabes o que eu li.
Por um breve instante, senti que os nossos corações eram ímanes e que o abraço tão desejado era iminente.
Um beijo queimava nos meus lábios.
Era preciso soltá-lo.
Entregá-lo à tua dança que parecia não mais terminar, mesmo quando a música parava.
Eu soltei-o, sentiste?

A História

Julho 29th, 2009

Foram os teus olhos
E o teu sorriso
Que uma tarde
Me disseram que me amavas
E eu amei-te

Foram as canções
Os poemas
Que uma manhã
Me acordaram para o teu corpo
E eu vivi-te

Foi a vida
O crescer
Que uma noite
Me disseram que eras mais que o Amor
E eu chorei

Querias…

Julho 20th, 2009

Quiseste construir um castelo
Mas só tinhas fósforos queimados
Quiseste dançar a dança da loucura
Mas o teu corpo é uma máquina desarticulada
Quiseste cantar um hino triunfal
Mas a tua voz há muito que perdeu o tom
Quiseste pintar uma obra prima
Mas os teus pincéis desdenham o bom gosto
Quiseste esculpir a estátua de Deus
Mas criaste uma rocha tosca e disforme
Quiseste ser mulher
Mas não passas de uma fêmea

Foi em vão

Julho 2nd, 2009

Foi em vão
Um deserto em fogo
Foi em vão
O gelo quente
Foi em vão
Correr para trás
Foi em vão
Matar para morrer
Foi em vão
Parar o anoitecer
Foi em vão
As quedas de água
Foi em vão
O canto do poeta
Foi em vão
Dormir sem fechar os olhos
Foi em vão
Acordar para sonhar

Cama coração

Junho 24th, 2009

Acordei sem ti
A cama estava vazia
Tinhas partido
Mas deixado o teu coração
Debaixo da almofada

Abracei-me a ele
Como se abraçasse a vida
E senti-te beijar-me
Como nas noites de Verão
Em que as horas eram dias
E as estrelas o nosso leito

O dia foi longo
Pois cada segundo sem ti
São mil anos

Esperei-te à janela
Queimado pelo sol
Gelado pela chuva
Cortado pelo vento

Mas vieste
E contigo trouxeste a doçura
O repouso de um olhar
A carícia de um dedo

Pegaste-me ao colo
E levaste-me de novo para a cama
O coração continuava debaixo da almofada

Podias tê-lo guardado de novo em ti
Mas foi no meu coração que o fechaste para sempre

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.