António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

“Xàbia” – Salvador Salvá Sapena

Julho 28th, 2022

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS -“Então ainda não falaste desta?”

Estaremos todos de acordo que “Manuel Joaquim de Almeida”, feitas as contas, será a marcha mais tocada em entradas, despedidas e não só.

Mas esse lugar tende, cada vez mais, a ser disputado por outra “marcha” que, na verdade, é um “pasodoble”, mas que o compositor sempre insistiu que fosse considerado “pasacalle”. Um “pasacalle” que já ganhou o estatudo de “Clássico Filarmónico”.

Só podia falar do, ou da, “Xàbia”, de Salvador Salvá Sapena.

Mas há alguém que nunca tenha tocado o, ou a, “Xàbia”?

No entanto, o fenómeno “Xàbia” extravasa a Península Ibérica.

É impossível saber quantas vezes o “Xàbia” foi executado em todo o mundo desde que foi publicado em 1976. Este “pasacalle” levou o nome da cidade Xàbia praticamente aos cinco continentes e tornou-se uma das referências mundiais na música deste estilo.

Mas qual é o segredo desse sucesso? Como é que “Xàbia” apaixona músicos, maestros e público, da Bolívia ao Cazaquistão? Na verdade, a característica mais importante da peça é a sua simplicidade.

Miguel Salvà, filho do compositor:

“Quando o meu pai começou a compor, era uma obra extensa, muito densa”.

Isso foi no início de 1976. Ao longo da primeira metade do ano, Salvador Salvà fez a banda Xàbia – da qual ele era maestro – ensaiar a música repetidamente. E foi retocando-o, simplificando-o, de mais para menos em comprimento, até encontrar a medida certa na introdução. Apesar de já ter quase 50 anos na época, começou a desenvolver a capacidade de criar harmonia, já que durante o seu serviço militar tinha contactado com grandes arranjadores. Em agosto de 1976, decidiu que a obra estava pronta, tendo sido publicada no final do ano.

“Xàbia” foi composto, justamente, para ser tocado pelas ruas durante as festas e começou a espalhar-se sem parar. Além de Espanha, a França foi o primeiro país em que esta música se enraizou. Foi rapidamente ligada ao mundo das touradas mas também a outros eventos festivos. E ainda está presente. Tanto que o pasodoble “Xàbia” serviu de banda sonora para o filme “Le fils à Jo” lançado com sucesso em 2010.

“Xàbia” também cruzou o oceano, primeiramente no México e espalhando-se à restante América Latina.

Essa fama mundial levou a que “Xàbia” fosse tocado em lugares tão distantes quanto a Ucrânia e até mesmo o Cazaquistão.

“Nem hino, nem letra”. A partitura de “Xàbia” destina-se apenas a isso, como música ligada à festa. Não é um hino. E não havia letra. O compositor criou-o apenas com música. As letras que estão atualmente anexadas à peça foram adicionadas por outros.

Salvador Salvà (Xàbia, 1927-2011) deixou a sua marca no Centro Musical Artístico de Xàbia, não só pela composição do “pasacalle” tão universalmente conhecido. Durante os 9 anos em que foi maestro (1969-1978), a banda viveu dois momentos históricos: primeiro, a incorporação de mulheres na entidade e, segundo, a primeira viagem ao estrangeiro, especificamente para a Alemanha.

Fonte: http://blog.xabia.org/el-secreto-de-xabia-el-pasodoble-que-emociona-en-todo-el-mundo/

Aqui fica na interpretação da Banda da Trofa, dirigida por Luís Campos, num registo de Damião Silva.

 

Partiram “os” Vangelis

Maio 19th, 2022

Partiu o Vangelis. Músico, compositor, produtor grego que muita gente achava ser uma banda: os Vangelis.

 

Parece ridículo, mas é legítimo. O nome termina em S: plural.

 

Já ouviram bem as obras de Vangelis? É impossível aquilo ser tocado por apenas uma pessoa. Tem que ser uma banda.

 

E o tema épico do filme “1492”? É um coro: os Vangelis.

 

Parece ridículo, é ridículo, mas esta conversa aconteceu mesmo, precisamente na época em que o tema “Conquest of Paradise” bombava em todo o lado, até nas campanhas do Guterres.

 

A dada altura desisti de argumentar e deixei-os acreditar que Vangelis era mesmo uma imensa orquestra com coro.

 

Só me arrependo de, há tempos, ter destruído o orgulho daquele colega que se gabava de ser grande apreciador da música dos Enaudi.

 

Idiossincrasias da música electrónica ambiental.

 

Problemas que o “trio” francês “Jean Michel Jarre” nunca teve.

 

 

 

 

 

 

“Damião Silva” – Vitor Resende

Abril 18th, 2022

Hoje, 18 de Abril, o Grande Curador do Reportório Filarmónico, autor de muitos dos vídeos desta rúbrica, Damião Silva, completa mais um aniversário e, por isso, faz todo o sentido partilhar esta marcha, de autoria de Vitor Resende, composta em sua homenagem.

Aqui fica na interpretação da Banda Marcial de Fermentelos, sob a direcção de Hugo Oliveira (e comigo ali no bombo).

Parabéns, Sr. Damião! Espero encontrá-lo, muito em breve, numa romaria algures por aí:

“Poeta e Aldeão” – Franz von Suppé

Abril 16th, 2022

Por incrível que pareça, estava perfeitamente convencido que já tinha dedicado um artigo a esta obra, um clássico a todos os níveis. Mas não. Estava no fundo da pasta à espera de vir para a estante dos Clássicos.

“Poeta e Aldeão” estreou-se como música incidental para uma comédia de Karl Elmar, com o mesmo título, mas viria a ser transformada, após a morte de Suppé, numa opereta em três actos.

Contudo, foi a sua abertura que ficou popularizada no reportório sinfónico e filarmónico. É um verdadeiro hit nos arraiais de Norte a Sul de Portugal.

E sim, os arraiais estão a regressar.

Este é um daqueles exemplos que demonstra que uma obra sinfónica para ser bela, não precisa ser difícil. Contudo, a sua “facilidade” é aparente. Já vi muito bom clarinetista a dar nós nos dedos a tocar isto.

Aqui fica “Poeta e Aldeão” na interpretação da Banda Musical de Souto, sob a direcção do meu grande amigo, Manuel Luís Azevedo, num registo da Afinaudio:

 

“Rapsódia Hilariana – N.º3” – Sousa Morais

Abril 8th, 2022

Toquei a “Hilariana” uma vez na vida, curiosamente no meu primeiro concerto filarmónico, a 19 de Março de 1994.

O valor desta obra, para mim, é mais sentimental do que propriamente musical e ouvi-la tantos anos depois é uma autêntica viagem no tempo.

Curiosamente, esta partilha surge na véspera de um concerto de tributo à filarmonia, pela Banda Sinfónica Portuguesa, no qual a “Hilariana”, de Sousa Morais, será interpretada.

Aqui fica na interpretação da Orquestra de Sopros da Universidade de Aveiro, dirigida por Luis Carvalho:

Andamentos

Março 31st, 2022

O medley “Francisco Magalhães” de Luís Cardoso já foi abordado neste espaço em tempos.

Uma obra relativamente recente mas, definitivamente, um clássico.

Para hoje, proponho um pequeno exercício:

1º – Vamos ouvir os próprios Scorpions a interpretar o “Rock you like an hurricane”, aqui:

2º – É neste andamento que tocam nas vossas bandas? Em caso negativo, justifiquem.

3º – Concordam com a frase “No andamento em que os Scorpions tocam, fica bem melhor, com um groove mais poderoso!” ? Justifiquem.

As romarias estão a regressar…

E se fosse contigo? Ria às gargalhadas.

Março 29th, 2022

Quem nunca contou (ou riu de) uma piada parva, racista, homofóbica, de humor negro, maldosa, que atire o primeiro estalo.

Quem nunca riu ao ver os cromos esbardalharem-se ao comprido no “Isto Só Vídeo”, que atire o segundo.

Quem nunca ofendeu ninguém na vida, propositada, ou acidentalmente, que atire o terceiro.

Somos assim, enquanto humanos. Por muito que enverguemos uma hipócrita capa de educadinhos, atinadinhos e respeitadores, há sempre um momento das nossas vidas em que rimos da desgraça alheia.

A pantomina entre Will Smith e Chris Rock levantou novamente a lebre dos limites no humor. Enquanto defensor acérrimo que, no humor, principalmente no humor, não deve haver limites, ouço muitas vezes “e se fosse contigo?”. Se fosse comigo eu ria-me.

Posso ser um gajo estranho, mas acho que uma das melhores formas de lidar com a tragédia é o humor. É rir e mostrar que estamos vivos.

Sei que nem todos pensam assim e entendo. É sempre mais fácil chorar.

“Oh… estás doente? dói muito, não é? tenho tanta pena de ti…” Mas, se algum dia (cruzes canhoto!) eu for visitado por uma doença grave, por favor, façam-me rir e não tenham pena.

A pantomina entre Will Smith e Chris Rock revelou também a extensa hipocrisia das últimas semanas, relativamente à invasão da Ucrânia.

Muitos dos que enchem as redes sociais com “stop the war”, aplaudiram o estaladão. Muitos dos pacifistas de pacotilha acham bem uma pessoa ser agredida enquanto (bem ou mal) faz o seu trabalho. Muitos dos “fuck Putin”, legitimam a violência.

“Ah… mas o Chris Rock ofendeu a mulher do Will Smith!”

Pronto, e o Putin também se sentiu ofendido por a Ucrânia querer aderir à NATO. E agora?

É frequente os mais velhos manifestarem preocupação com a “perda de valores da sociedade”. Eu preocupo-me com a perda do sentido de Humor, da capacidade de nos rirmos das situações mais tristes, duras e negras da nossa vida. Preocupo-me que estamos a construir uma sociedade cinzenta, esterilizada, sem cor, sem cheiro, insípida.

Aqui há dias, ouvia uma figura da rádio portuguesa, falar da sua doença, de uma forma bem humorada, divertida, que me fez aprender mais sobre essa doença, do que qualquer discurso carregado de seriedade e cinzentismo.

Não acham piada? Ofende-vos? Estão no vosso direito, mas esse direito não implica agredir ninguém.

O Chris Rock não se pôs a jeito para levar um estalo. A Ucrânia não se pôs a jeito para ser invadida. Uma rapariga seminua não se põe a jeito para ser violada.

A violência é sempre, sempre, sempre culpa do agressor e normalizar isso é ser cúmplice.

“76 Trombones” – Meredith Willson

Fevereiro 18th, 2022

Lembram-se de quando éramos miúdos e aparecia um brinquedo da moda e, re repente, toda a gente brincava com aquilo. Os yo-yo’s, por exemplo. Depois eram os berlindes. Depois outra cena qualquer. As modas vinham e iam.

No reportório filarmónico acontecem fenómenos semelhantes.

Ali no início dos anos 2000, de repente, apareceram os “76 trombones” e toda a gente começou a tocar.

“76 trombones” é uma popular melodia do musical “The Music Man” e dos filmes (1967 e 2003) inspirados no mesmo.

A história desta canção até é engraçada, dado que se trata da bazófia de um “professor” sobre uma banda com… 76 trombones. A letra é deliciosa e eu nem traduzi para não perder a piada:

Seventy six trombones led the big parade,
With a hundred & ten cornets close at hand.
They were followed by rows and rows,
Of the finest virtuosos,
The cream of every famous band.
Seventy six trombones caught the morning sun,
With a hundred & ten cornets right behind.
There were over a thousand reeds,
Srpinging up like weeds,
There were horns of every shape & size.
There were copper bottom timpani in horse platoons,
Thundering, thundering, all along the way.
Double bell euphoniums and big bassoons,
Each bassoon having its big fat say.
There were fifty mounted canons in the battery,
Thundering, thundering, louder than before.
Clarinets of every size,
And trumpets who’d improvise
A full octave higher than the score!
Seventy six trombones hit the counterpoint,
While a hundred and ten cornets blazed away.
To the rhythm of Harch! Harch! Harch!
All the kids began to march,
And they’re marching still right today!”

Bazófia… quem nunca?!

Ao fazer o arranjo para banda, Nahoiro Iway, meteu uns “pózinhos” lá pelo meio, incluindo o “The Stars and Stripes Forever”.

Tudo somado, soa sempre bem e tornou-se um clássico deste lado do Atlântico.

Aqui na interpretação da Banda de Fajões, sob a direcção de Bruno Costa. Partilho também abaixo duas incríveis versões do original:

 

 

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.