Hoje em dia, vamos às festas e ouvimos sempre as mesmas rapsódias.
Na altura em que comecei a tocar, há quase trinta anos, havia mais variedade.
Agora também há, mas na época as bandas diversificavam mais o seu reportório neste género, parece-me…
Uma rapsódia que toquei muitas vezes na Sociedade Filarmónica de Crestuma e que eu acho muito bem conseguida, a nível melódico e orquestral, foi a n.º 8 de Ilídio Costa, “Alegia no Arraial”.
É diversificada em temas, substituindo o tradicional “fado” central por uma “barcarola”, com uma das melhores “chulas” que conheço e finalizando com um “corridinho” impressionante.
Se algum amigo maestro tiver isso em arquivo, por favor, toque, grave e partilhe muito.
Depois de muita pesquisa encontrei apenas e só esta gravação da Banda Recreativa de Bucelas, sob a direcção do Maestro Luis Fernandes dos Santos, dividida em dois vídeos:
Depois de anos a levarmos com o ABBA Gold (e do ABBA Gold a levar connosco… coitado), surgia finalmente um medley de canções dos ABBA orquestrado à medida das nossas filarmónicas.
É verdade que as canções dos ABBA ajudam. São composições uns níveis acima daquilo que são as simples canções pop. Ricas do ponto de vista melódico, apresentam sempre várias camadas sonoras, o que dá para distribuir jogo pela banda toda. E depois há o talento do Luis Cardoso para estas coisas, mostrando que é um compositor / orquestrador completo.
Os seus arranjos de música ligeira são tão bons que já sabemos que são bons antes de os tocarmos.
E também sabemos que são bons ao tocarmos. Lembro-me de, aqui há uns anos, estar a tocar isto e as lágrimas caírem-me pelo rosto, num concerto memorável da Marcial de Fermentelos, em Espadanedo, Cinfães.
A primeira vez que ouvi a obra foi, precisamente, no concerto que abaixo partilho. Banda de Vilela, sob a direcção de José Ricardo Freitas, ao vivo na Casa da Música:
A peça favorita para os clarinetistas brincarem com o registo grave. Se tiveres na mão um clarinete baixo, melhor ainda.
“La Boda de Luis Alonso” ou “La noche del encierro” é uma zarzuela de um ato, dividida em três quadros, em verso, com música de Gerónimo Giménez e libreto de Javier de Burgos. Estreou no Teatro de la Zarzuela em Madrid, a 27 de janeiro de 1897.
Este intermezzo é, provavelmente, o pedaço de música instrumental mais famoso de toda a história das zarzuelas.
É encore quase obrigatório lá para os lados de Madrid e uma boa espanholada para rebentar num coreto aqui para os lados de Portugal. Daquelas obras pequeninas que fica bem em todo o lado e a todo o momento.
“Obra que eu gosto mesmo de ouvir numa banda é o Capricho Italiano! Quem tocar o Capricho Italiano, a mim, deixa-me satisfeito!”
Disse-me uma vez, o meu tio Zeca, grande apreciador de bandas, com incontida emoção. O meu tio Zeca levantava-se de madrugada para “apreciar a entrada das bandas”.
Lembro-me que nesse dia “discuti” com o meu tio Zeca, pois estava na minha fase “as bandas não devem tocar transcrições.”
As pessoas mudam, amadurecem e, de facto, apesar da imensa dificuldade, o Capricho Italiano, quando bem tocado, resulta.
Aliás, a escrita sinfónica de Tchaikovsky, normalmente, resulta nas bandas.
“Já completei os esboços de uma fantasia italiana fundada em melodias folclóricas, para a qual acredito que pode ser prevista uma boa fortuna. Será eficaz, graças às melodias deliciosas que consegui reunir, em parte de antologias e em parte dos meus ouvidos nas ruas.”
…disse o próprio em carta à sua amiga e patrona Nadejda von Meck.
Inicialmente intitulado de “Fantasia italiana”, foi originalmente dedicado ao violoncelista virtuoso Karl Davidov, e estreou em Moscovo a 18 de dezembro de 1880, com Nikolai Rubinstein à frente da Sociedade Musical Imperial Russa.
Aqui fica na interpretação da Banda de Revelhe – Fafe, sob a direcção do Maestro Paulo Pereira:
Ontem, 1 de Julho de 2021, esta instituição completou 100 anos.
Foi em Maio de 1993 que, timidamente, entrei naquela casa pela primeira vez. Em Novembro do mesmo ano tinha a minha primeira aula de percussão. Em Janeiro do ano seguinte o primeiro ensaio com a Banda. A 19 de Março de 1994, o primeiro concerto.
Por lá fiquei até Novembro de 2006. 12 anos durante os quais fiz amigos para a Vida e cresci como músico e ser humano. Orgulho-me do legado que deixei na Instituição mas, acima de tudo, do legado que a Instituição deixou em mim e que agora transmite ao meu filho Lucas e a dezenas de outras crianças.
A SFC, como tantas bandas do nosso país, é a porta de entrada para a formação cívica de muitos jovens. O cumprimento de horários, o honrar uma farda, o respeito pelas hierarquias e pelos mais velhos. O valor do acordar cedo, do trabalho duro, do espírito de grupo. O mérito de nos superarmos. A beleza da Arte.
A SFC tem sido uma fonte de músicos, maestros e professores para todo o país.
É frequente cruzarmo-nos por aí, em festas e romarias, em concertos, em conservatórios e outras escolas.
As duas frases que repetimos uns aos outros são sempre as mesmas:
– E daquela vez na banda de Crestuma?
– Um dia havemos de nos encontrar lá todos.
Parabéns à banda de Crestuma e a todos os que têm um bocadinho da banda de Crestuma no seu ADN musical e humano.
Subia ao palco pela primeira vez e a obra com que o concerto abriu e se tornou a primeira obra que toquei, em público, com uma filarmónica, foi o pasodoble galego “Puenteareas”.
Do compositor Reveriano Soutullo, foi estrado a 20 de Outubro de 1929, tendo sido composto em homenagem à sua terra natal, Puenteareas.
Soutullo destacar-se-ia pela composição de zarzuelas, duas das quais costumam andar aí nas capas: “La Leyenda del Beso” e “La del Soto del Parral” (da qual falaremos mais tarde.
“Puenteareas” é um pasodoble bastante agradável, de execução acessível, onde o ambiente galego está bem patente.
Passou o mês de Junho, os Santos Populares, as Marchas e Rusgas… (ok… este ano não se terá marchado muito…).
Por isso, parece-me bem abrir a Terceira Temporada – “Qual é que vai?”, onde volto a obras mais “curriqueiras”, ao ambiente de romaria, com um verdadeiro clássico.
“Marchas de Lisboa”, “Feira Popular”, “Festa na Feira”, “Festival de Bandas” são alguns dos títulos com que este medley frenético do Maestro João Neves aparece nas nossas cadernetas.
Esta é daquelas que ao 9º compasso arranca logo palminhas no público e um ou outro pezinho de dança.
Da “erudição” das últimas semanas, directamente para o arraial.
O misterioso primeiro andamento da obra leva a que a mesma se estranhe. O furioso terceiro andamento entranha-nos à força. Pelo meio, a delicadeza do Intermezzo.
A quarta sinfonia de Alfred Reed (compositor americano que se tornou popular em Portugal com “El Camiño Real” e “Golden Eagle”) é como um daqueles filmes de Hollywood: mistério, paixão, drama, romance, erotismo, violência e até humor.
Honestamente, é das obras mais completas que conheço e também mais difíceis.
Encomendada para o “World Music Contest” em 1993, abre com uma Elegia, construída em grande parte sobre um ritmo básico suave, insistente, ouvido pela primeira vez nas flautas, sob o tema principal do oboé. O desenvolvimento desses dois motivos passa por toda a banda, às vezes na forma de tristes “canções”, outras com um carácter altamente dramático, até à suave estabilização final do andamento, num acorde mi menor. Um contraste evidente com todo o restante andamento, principalmente não tonal em estrutura e sentimento.
Segue-se um contrastante intermezzo gracioso, desenvolvido a partir de um tema tranquilo e cadenciado com um ligeiro toque de sabor latino, a remeter-nos para o “El Camiño Real”, destacando as madeiras da banda lançadas num elegante compasso 5/8 metros em grande parte da textura. A fusão entre os sopros e a percussão é feita pela harpa, que às vezes parece quase soar como um grande violão espanhol, dedilhando acompanhamentos às várias linhas melódicas.
O último andamento é, novamente, um contraste com o momento anterior. Uma tarantela ardente, baseada em um tema fugal que é desenvolvido com todo o virtuosismo inerente às bandas modernas e totalmente integrado, que varre o ambiente implacavelmente até uma conclusão final e brilhante tanto quanto ao seu próprio andamento quanto à obra como um todo.
Infelizmente, não encontrei gravações de bandas portuguesas a interpretar a obra, pelo que deixo-vos aquele que é, provavelmente, o mais mítico registo da mesma: a Koninklijke Harmonie van Thorn, dirigida por Jan Cober, precisamente no WMC, em Kerkrade.