Uma das memórias mais fortes do Natal da minha infância tem a ver com aquela janela.
Não sei se seria mágica, mas irradiava magia.
Com a devida antecedência (não tanta como é agora frequente) iluminava-se. Pisca-pisca. Acende apaga. Vermelho, azul, verde, amarelo, laranja.
Nada daquelas luzes XPTO dos nossos dias.
Um rectângulo colorido, na rua que continua exígua, apesar de ser a central.
Gostava de passar ali à noite, só para a ver brilhar.
No interior, brinquedos e mais brinquedos. Num espaço incrivelmente pequeno. Como era possível, naquele cubículo caber tanta coisa? Mas cabia.
E as luzes adornavam o misterioso e encantador pórtico.
Entrando na lojinha, o balcão surgia logo ali à porta, não deixando espaço para mais de duas três pessoas.
O interior era ainda mais recheado. Cada centímetro quadrado era devidamente aproveitado. Ali vendia-se praticamente tudo.
Mas o que interessava eram os brinquedos. E o papel de embrulho. E os rolos de fita colorida, que dariam lugar aos lacinhos, enroscados com a ajuda de uma tesoura. E o dispensador de fita cola, azul e laranja, tradicional da “Tesa Film”.
A loja do senhor Augusto, carinhosamente conhecido como sr. “Belinha” (apesar de o próprio não apreciar a designação) era um recanto de magia.
Dali saiam muitos dos presentes que, na Noite de Natal, estariam junto aos sapatinhos.
Dali saíram alguns dos meus presentes e dos primeiros presentes que ofereci à minha família, quando já tinha juntado uns troquitos.
Era impossível resistir, passar e não parar. Aquela pequena janela tinha um poder encantador.
Quando ela se iluminava, sabíamos que o Natal estava próximo.
Confesso que cheguei a sonhar que a janela se abria e eu podia pegar em todos os brinquedos.
Agora, a janela está fechada e o sr. Augusto velho e doente.
Mas, em cada Natal, a janela continua iluminada na minha memória.