António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.

Tudo o que eu te dou

Novembro 8th, 2024

(foto Facebook de Pedro Abrunhosa)

 

Há 30 anos, tinha eu 14, a caminho dos 15. Surgia então nas rádios e TVs, um novo personagem: boina magrebina na cabeça rapada, pelos faciais cortados em estranha forma, roupas estravagantes e permanentes óculos escuros. E, melhor que tudo isso: uma música diferente de tudo aquilo que por cá se fazia, funk em português, dançável, com uma lírica arrojada, atrevida e explosiva. Pedro Abrunhosa e os Bandemónio foram (são) um momento de singularidade na música portuguesa.

 

Com P.A. quebrou-se o mito de que um cantor tem que ter a voz perfeitinha, arrumadinha e limpinha. Um cantor, Lead Singer, frontman, tem que tocar-nos na Alma. Ouçam Tom Waits, Leonard Cohen.

 

Com P.A. percebemos que um concerto pop, rock, ligeiro é mais do que Música. Tem um argumento, um cenário, figurinos. É performance. “Ensinei os meus alunos a entrarem e a sair do palco, que roupas vestirem. A roupa de palco, não pode ser a roupa da rua.”

 

Com P.A. percebemos que todos os pormenores contam, desde a música trabalhada como ourivesaria, às letras que vão da profundidade poética de um “Será”, à lascívia do “Não posso +”, passando pela afronta do “Talvez F”.

 

P.A. mostrou-nos que “perante a violência, a guerra e destruição, as palavras são a menor das obscenidades”.

 

Rodeou-se dos melhores músicos que encontrou, porque procurou sempre os melhores. Exigente, dentro e fora do palco, nunca pede menos que a excelência, até na forma de lhe servirem um sumo de laranja.

 

Há 30 anos, eu era um adolescente à procura da minha identidade, pessoal, artística e musical. P. A. ajudou-me a construir essa identidade.

 

Esta semana, ao celebrarmos os 30 anos do “Viagens”, das Viagens pelas quais P.A., os Bandemónio, os Comité Caviar nos guiaram, olhava em volta e media a média de idades do público.

 

Imaginei aquelas pessoas, há 30 anos, adolescentes como eu, outros mais velhos, mas todos eles a deixarem-se tocar pela tal “voz que não vale nada”, do “cantor que não canta”.

 

P.A. reinventa-se a cada novo disco. Passou o funk, o dance, o pop e o rock. É tudo isto, como amanhã pode ser nada.

 

Mas o Viagens…

 

30 anos depois, ele continua a fazer-nos saltar, acima e abaixo, mas continua também a mexer com os nossos sentidos, a viajar às profundezas da nossa Alma, deixando-nos o corpo trémulo, frágil, com lágrimas fugidias a espreitarem-nos nos olhos.

 

Olhava à volta e sentia uma conexão única. Sentia que vivi com aqueles milhares de desconhecidos uma vida em comum. Uma vida em comum dentro de cada disco, cada concerto, cada acorde e cada verso do P.A., porque tudo o que ele nos dá é nosso.

 

 

 

Vertiginosamente

Setembro 9th, 2024

As manhãs frias de Abril dão lugar às tardes frias de Setembro. É o cheiro a Outono que se aproxima, os dias que ficam mais curtos.

Parece que ainda ontem acordávamos estremunhados para mais uma época filarmónica e nisto ela chega ao fim.

Vinte despiques, com treze bandas diferentes.

Muitos kilómetros de Águeda a Monção, entre Douro e Minho, entre o Porto e Vila Real.

Foi mais uma época de poeira nos sapatos, suor no rosto e felicidade na Alma.

Semana após semana, parecia que o corropio não teria fim.

“Vertiginosamente” estávamos no “querido mês de Agosto”, no qual adormecíamos e acordávamos com a farda.

Foi a época dos reencontros: em Saudel, os Carlos (Mendes e Pereira) vieram dar-nos um caloroso abraço e o tempo recuou vinte, trinta anos.

Reencontrei o clarinete: o Daniel pôs a máquina como nova e redescobri o fascínio do instrumento. Das dores iniciais na embocadura, até ao gozo indescritível naquele andamento lento do “Arco-Íris”, ou na correria da “Húngara”.

Foi tudo isto e muito mais. Memórias que de tão grandes e eternas, não cabem num ecrã em branco: baquetas, monta-desmonta percussão, palhetas, monta-desmonta clarinete, corre para a Igreja, ensaia o salmo, viagens, palcos, coretos, copos, sestas, sorrisos, festa, rock… Rambóia.

“…e temos a Rosa Evangélica.”

De 1994 a 2024, trinta anos de Filarmonia. Como é possível que, ao cabo de três décadas, a emoção continue renovada? Que magia é esta que, no dia seguinte, nos deixa um vazio no peito e a ansiar “vertiginosamente” pela próxima manhã fria de Abril?

 

P.S. – a última foto de naipe da época:

Je suis Bordalo II

Agosto 2nd, 2023

Após a espetacular e pertinente instalação de Bordalo II no palco das JMJ, muita gente tentou desancar o artista com argumentos que, a mim, parecem pouco válidos e facilmente desmontáveis.

A vida e obra de Bordalo II falam por si e, certamente, não precisa que o defendam, mas custa-me ficar quieto perante aquilo que vou lendo por aí.

1 – “Ah… eu nunca tinha ouvido falar dele…”

Bem, isso diz mais sobre ti, do que sobre ele. Bordalo II é, provavelmente o maior e mais influente artista de arte urbana e ecológica em Portugal e uma referência a nível internacional. Há obras suas espalhadas por todo o país e um pouco por todo o Mundo. Algumas, já as deves ter visto e até gostaste.

2 – “Ah… ele recebeu muito dinheiro do Estado…”

E ainda bem! É uma das funções do Estado apoiar a Arte. Mais a mais, caso não saibas, um artista não tem salário e precisa de dinheiro para produzir as suas obras. Além disso, o Bordalo II tem uma equipa que o ajuda na construção das suas obras e, claro, tem que lhes pagar. Numa altura em que a Arte, a Cultura e todas as pessoas que desenvolvem as suas profissões neste meio sofrem tanto com cortes e mais cortes, é de louvar que um artista veja o seu trabalho reconhecido e apoiado pelo Estado.

3 – “Ah… mas porque é que ele não critica outra coisas?”

Critica, sim. Mais uma vez, esse argumento só demonstra a tua ignorância. Por outro lado, desconheces o conceito de “liberdade criativa”. Um artista, seja ele qual for, pintor, músico, compositor, escritor, é livre de falar sobre o que bem lhe apetece. Alguma vez questionaram Wagner o porquê das suas óperas serem maioritariamente sobre mitologia? Porque é que o Nicholas Sparks só escreve romances de “lágrima no olho”?

Uma produção artística sai da Alma de quem a cria. Na Teoria Musical de Artur Fão está escrito que “a Música é a Arte de expressar sentimentos ou impressões através de sons”, mas não tem uma lista de sentimentos, ou impressões, que possam, ou devam ser expressos. O mesmo se aplica a outras formas de Arte.

Era o que faltava um artista ter que pedir licença para se expressar sobre este ou aquele tema.

4 – Por fim…

A Arte não é só Estética. A Arte não é só uma bela sinfonia de Beethoven (alguém também muito interventivo!) ou um quadro de Da Vinci para ficar numa parede, ou num museu. A Arte é questionar, intervir, incomodar, fazer as pessoas pensarem. Quem viu as notas de 500€ do Bordalo II, mesmo que não concorde, pelo menos durante 10 segundos pensou sobre aquilo e a função da obra está cumprida. Quem vê os filmes de Lars von Trier, sente inquietação, pensa até em sair da sala.

E muitos outros exemplos, de artistas que, de certa forma chocaram poderiam ser citados.

Quem ouve o “Talvez F” do Pedro Abrunhosa fica desconfortável, chocado, ou curte este groove:

“Lohengrin” – Richard Wagner

Maio 17th, 2023

Aviso prévio: as óperas de Wagner são longas. Logo, este “Clássico” também vai ser. Tirem uns bons minutos para ler e ouvir.

Depois de uma longa ausência, volto aos “Clássicos Filarmónicos” para abordar uma obra sobre a qual sempre quis falar, mas da qual me faltava um bom registo sonoro e visual.

“Lohengrin” é um clássico, não por ter sido uma obra muito tocada no passado, hoje em dia ainda menos, mas por se revestir de uma aura de inacessibilidade, daquelas partituras só ao alcance das grandes bandas. Um velho amigo meu, por exemplo, para referir a qualidade da sua banda dizia sempre “nós tocamos o «Lingrin»!»

Nunca os ouvir tocar o tal «Lingrin», mas a verdade é que poucas bandas tinham a obra na estante.

Felizmente para mim e, permitam-me a ousadia e vaidade, para o nosso universo filarmónico, o Maestro Hugo Oliveira lançou a sua seleção da ópera de Wagner no reportório da Marcial de Fermentelos, para a época 2023.

«Conheci o Lohengrin na década de 90 quando comecei a tocar nas filarmónicas, na banda da Trofa. Nessa época, e apesar de já estar “reformado”, o prof. Gomes era sempre convidado pelo maestro Francisco Ferreira para dirigir duas peças do repertório da banda: Ecos de Espanha e Lohengrin.
Apesar de ser um puto que estava a começar, sentia já que quando o prof. Gomes subia ao palco a banda era, imediatamente, outra, e no Lohengrin era algo de único.
A minha paixão pela obra vem desde aí…
Passado uns anos, quando fui maestro na ACMA, após concluir o arranjo da “Boris Godunov“, dediquei-me a transcrever o Lohengrin, tendo como base o arranjo que se tocou na Banda de Música da Trofa e também a partitura da ópera que obtive no IMSLP. Para isso, ouvi a ópera na íntegra (nunca o tinha feito) e fui apontando as secções que gostaria de acrescentar. Comecei o trabalho, demorou uns meses valentes. Cada secção era melhor que a anterior e quando dei por mim… Tinha quase meia-hora de música!…
Nunca tive a oportunidade de a trabalhar na ACMA, mas na Marcial de Fermentelos consegui fazê-lo. Não tocamos o arranjo na íntegra, porque senão, em despique, monopolizavamos o tempo do concerto só pra nós! Talvez um dia me arrisque a fazê-lo em concerto…»

…e, caro Hugo, o arranjo está soberbo, resulta muito bem tanto em arraial, como em concerto. Contudo, permite-me destacar dezasseis compassos. Aqueles dezasseis compassos, já perto do final, sempre em crescendo. Um crescendo contínuo de intensidade e daquela emoção tão Wagneriana. Um momento de elevação para quem ouve e para quem toca.

No ano em que se assinalam 210 anos do nascimento e 140 da morte de Wagner, faz todo sentido recuperarmos “Lohengrin”, estreada em Weimar, Alemanha, a 28 de agosto de 1850 sob direção de Franz Liszt, amigo próximo de Wagner que, para além da música, escreveu o libreto.

“A história de Percival (ou Parsival) e seu filho Lohengrin, o cavaleiro do cisne, provém da literatura medieval germânica, especialmente do Parzival, de Wolfram von Eschenbach, e da sua continuação anónima, Lohengrin, inspirada na saga de Garin Le Lorrain (ou Garin le Loherin), a qual integra a Gesta dos Lorenos, ciclo de cinco canções de gesta dos séculos XII e XIII, escritas em loreno românico.

O enredo decorre durante a primeira metade do século X no Ducado de Brabante (na atual região de Antuérpia, Bélgica, no rio Escalda). O falecido duque do Brabante confiara seus herdeiros – Elsa e Gottfried – à tutela do conde Frederico de Telramund. Frederico deveria ter esposado Elsa, mas, tendo sido recusado por ela, casa-se com Ortrud, descendente de uma estirpe de príncipes pagãos, cujas divindades são dotadas de poderes mágicos. Para vingar a afronta sofrida por seu marido e para que este possa herdar o ducado, Ortrud transforma Gottfried em cisne, convencendo Frederico a acusar Elsa de fratricídio.” (fonte: Wikipedia)

Aqui fica a seleção da ópera “Lohengrin” de Richard Wagner, por Hugo Oliveira, numa interpretação da Banda Marcial de Fermentelos e registo de Damião Silva.

Toda a gente (um país à medida)

Março 22nd, 2023

Toda a gente dizem que toda a gente “devia seguir o exemplo do Comendador Rui Nabeiro”. Mas ninguém diz “eu vou seguir o seu exemplo”.

Toda a gente queria o Fernando Santos fora de seleção e já toda a gente critica o novo selecionador.

Toda a gente está do lado do Pichardo, mas toda a gente é contra a naturalização do Otávio.

Toda a gente faz greve contra o Governo, mas toda a gente lhe deu maioria absoluta.

Toda a gente quer ganhar mais, mas toda a gente quer trabalhar menos.

Toda a gente queria um Vice-Almirante em cada esquina, mas toda a gente acha que já quer mandar de mais.

Toda a gente é muito inclusiva, mas toda a gente quer os ciganos fora da escola dos filhos.

Toda a gente está contra a Igreja Católica, mas toda a gente acede velinhas em Fátima.

Toda a gente se refresca com a pimenta no anos de toda a gente.

 

 

 

 

 

 

Do Fim ao Recomeço

Outubro 5th, 2022

Há pouco mais de um ano, estava determinado a terminar a minha vida filarmónica. Tantos anos, tantas madrugadas de Domingo, arruadas e procissões intermináveis, concertos para ninguém, “não posso, tenho ensaio…”

Uma pandemia e a descoberta que os Domingos existem para lá dos arraiais.

Uma conversa circunstancial com um velho amigo e em menos de uma hora realizava um sonho antigo, um desejo de ambos. O recomeço.

As coisas acontecem quando têm que acontecer.

“Bem-vindo à Marcial.”

E começou uma viagem onde tudo soava à primeira vez. Aos 42 anos voltei a ser menino, a vestir uma farda com emoção, a acordar cedo sem resmungar.

Uma época que passou num sopro, de Vilar de Figos a Fermentelos, passando por Macinhata do Vouga, Rio Tinto, Forjães, Rio Mau, Vila Chã, Montalegre, Melres, Gens, Espadanedo, Perrães, Valinhas e Crestuma.

Crestuma, a terra que me viu nascer e crescer, onde toquei à distância de uma lágrima para o meu pai e para o meu filho, onde o coração pesou mais que a farda e as baquetas. Crestuma, onde 16 anos de desterro se esfumaram em 16 horas de emoção. Onde a Marcial deu tudo pelo seu Maestro. As marchas de Crestuma foram fermentelenses por breves minutos e o Hugo saiu “em ombros”: “Miguel! Miguel! Miguel!”

Que orgulho, meu amigo!

Em Melres, outro Miguel, o Mota, veio tocar connosco e viajamos para trás e para a frente no tempo.

A dada altura comecei a fotografar as multidões que nos seguiam. “Ainda alguém ouve bandas?”

Centenas, milhares de pessoas, de manhã à noite. Arraiais em silêncio para ouvir Wagner, Tchaikovsky ou Mussorgsky; em festa ao som de Scorpions ou… Toy!

A Filarmonia é assim do Povo para o Povo. Tudo tem o seu espaço.

Das entradas imponentes às despedidas apoteóticas. As viagens de carro com o Afonso, o Carlos, o Chico, o Daniel, o Noémio e a Rafaela, filha de dois amigos de sempre.

Amigos novos, no palco, na tasca dos finos, nas refeições. O orgulho de fazer parte de um naipe que tem tanto de talentoso como de espirituoso: o Zé, o Hélder, o Leonardo, o André e o Pedro (que agora são também “Rambóias”).

E tudo isto passou num sopro, um recomeço que ainda está no início.

“Concertino para bombardino” – Arie den Arend

Agosto 27th, 2022

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS – Finalmente encontrei!

A Banda da Trofa da segunda metade da década de 90, foi das melhores que já ouvi até hoje. Dirigida por Francisco Ferreira, que sucedeu ao mítico, histórico e icónico professor António Gomes, era uma verdadeira banda “all star”. Reunia alguns dos maiores (perdoem-me a expressão) “craques” da música à época, alguns já com carreiras consolidadas, outros que despontavam, muitos que hoje em dia continuam ligados à filarmonia, como maestros, executantes, professores.

Só para citar alguns nomes, por ordem alfabética:

Abel Pereira, Acácio Silva, Ana Maria Ribeiro, Bernardo Alves, Carlos Germano, Daniela Anjo, Fernanda Alves, Fernando Ribeiro, Gil Miranda, Hugo Oliveira, Isabel Anjo, Iva Barbosa, João Alves, Jorge Almeida, Jorge Madureira, Júlio Senra, Liliana Reis, Lino Pinto, Manuel Luís Azevedo, Manuel Moura, Nuno Pinto, Paulo Martins, Rosa Oliveira, Sílvia Janete, Telmo Barbosa, Vitor Matos…

…todos passaram pela Banda da Trofa.

Uma banda  que “debulhava” um reportório de grau de dificuldade elevado e que incluía este “Concertino” de Arie den Arend, escrito para tuba, ou bombardino solo, executado à época por Júlio Senra. Era uma obra que se destacava principalmente por ser raro, para não dizer único, uma banda apresentar uma peça solística para este instrumento.

O “Concertino” era de tal forma marcante na estante da Trofa que foi gravado em CD pela mesma.

Sobre o compositor, pouco se sabe, a não ser que nasceu em Pernis, a 3 de fevereiro de 1903, e faleceu em Roterdão a 22 de fevereiro de 1982. De 1916 a 1925 estudou órgão, teoria musical e composição. Foi maestro, professor e organista, dedicou-se principalmente à música para metais.

Na Internet não abundam os registos da peça, pelo que tive que recorrer a esta gravação, ao vivo, da Banda La Primitiva de Alborache – Valencia, com Andres Carrascosa Perez como solista.

 

 

“Xàbia” – Salvador Salvá Sapena

Julho 28th, 2022

CLÁSSICOS FILARMÓNICOS -“Então ainda não falaste desta?”

Estaremos todos de acordo que “Manuel Joaquim de Almeida”, feitas as contas, será a marcha mais tocada em entradas, despedidas e não só.

Mas esse lugar tende, cada vez mais, a ser disputado por outra “marcha” que, na verdade, é um “pasodoble”, mas que o compositor sempre insistiu que fosse considerado “pasacalle”. Um “pasacalle” que já ganhou o estatudo de “Clássico Filarmónico”.

Só podia falar do, ou da, “Xàbia”, de Salvador Salvá Sapena.

Mas há alguém que nunca tenha tocado o, ou a, “Xàbia”?

No entanto, o fenómeno “Xàbia” extravasa a Península Ibérica.

É impossível saber quantas vezes o “Xàbia” foi executado em todo o mundo desde que foi publicado em 1976. Este “pasacalle” levou o nome da cidade Xàbia praticamente aos cinco continentes e tornou-se uma das referências mundiais na música deste estilo.

Mas qual é o segredo desse sucesso? Como é que “Xàbia” apaixona músicos, maestros e público, da Bolívia ao Cazaquistão? Na verdade, a característica mais importante da peça é a sua simplicidade.

Miguel Salvà, filho do compositor:

“Quando o meu pai começou a compor, era uma obra extensa, muito densa”.

Isso foi no início de 1976. Ao longo da primeira metade do ano, Salvador Salvà fez a banda Xàbia – da qual ele era maestro – ensaiar a música repetidamente. E foi retocando-o, simplificando-o, de mais para menos em comprimento, até encontrar a medida certa na introdução. Apesar de já ter quase 50 anos na época, começou a desenvolver a capacidade de criar harmonia, já que durante o seu serviço militar tinha contactado com grandes arranjadores. Em agosto de 1976, decidiu que a obra estava pronta, tendo sido publicada no final do ano.

“Xàbia” foi composto, justamente, para ser tocado pelas ruas durante as festas e começou a espalhar-se sem parar. Além de Espanha, a França foi o primeiro país em que esta música se enraizou. Foi rapidamente ligada ao mundo das touradas mas também a outros eventos festivos. E ainda está presente. Tanto que o pasodoble “Xàbia” serviu de banda sonora para o filme “Le fils à Jo” lançado com sucesso em 2010.

“Xàbia” também cruzou o oceano, primeiramente no México e espalhando-se à restante América Latina.

Essa fama mundial levou a que “Xàbia” fosse tocado em lugares tão distantes quanto a Ucrânia e até mesmo o Cazaquistão.

“Nem hino, nem letra”. A partitura de “Xàbia” destina-se apenas a isso, como música ligada à festa. Não é um hino. E não havia letra. O compositor criou-o apenas com música. As letras que estão atualmente anexadas à peça foram adicionadas por outros.

Salvador Salvà (Xàbia, 1927-2011) deixou a sua marca no Centro Musical Artístico de Xàbia, não só pela composição do “pasacalle” tão universalmente conhecido. Durante os 9 anos em que foi maestro (1969-1978), a banda viveu dois momentos históricos: primeiro, a incorporação de mulheres na entidade e, segundo, a primeira viagem ao estrangeiro, especificamente para a Alemanha.

Fonte: http://blog.xabia.org/el-secreto-de-xabia-el-pasodoble-que-emociona-en-todo-el-mundo/

Aqui fica na interpretação da Banda da Trofa, dirigida por Luís Campos, num registo de Damião Silva.

 

António Pinheiro

Profissional de marketing, músico e corredor por prazer. Corre na estrada, no monte e de um lado para o outro na vida, atrás e à frente dos filhos.